domingo, 4 de janeiro de 2009

FATAL (Elegy, 2008), de Isabel Coitex


Fatal (2008) é um filme estadunidense da cineasta Isabel Coixet, baseado no romance de Philippe Roth e estrelado por Ben Kingsley (prof. David Kapesh) e Penélope Cruz (Consuela). A tradução do inglês "Elegy" (Elegia) para o português "Fatal" provocou algumas confusões por parte da crítica que parece não ter percebido a tradução como uma estratégia de marketing.

Elegia é um gênero de poema lírico que traz um sentido de morte, mas que também possui um sentido erótico entoado por poetas como Goethe e Rilke. É um termo pouco usual na linguagem cotidiana, o que talvez tenha influenciado a tradução em optar pela palavra Fatal, mais comum e que também guarda um sentido de morte e erotismo.
A palavra já serviu a outros títulos de filmes, como "Atração Fatal" (1987), de Adrian Lyne, e romances, a exemplo de "A Mulher Fatal" (1870), de Camilo Castelo Branco, portanto, fazemos parte de um legado cultural formado por um imaginário com base em relações desenfreadas e sexualmente obsessivas que culminam em morte. Portanto, seria esperado associar a fatalidade do filme ao poder erótico de Consuela, atribuído por Kapesh, por sua beleza.
De fato, se nos limitarmos a ver o filme nessa perspectiva, o resumiríamos na folhetinesca história de um homem idoso, de 60 anos, professor universitário, que se apaixona por sua aluna trinta anos mais jovem que ele. Esse eixo foi o mais evidenciado pela crítica, inclusive por meio de sites que publicaram, de forma sensacionalista, a nudez de Penélope Cruz.
Contudo, uma outra leitura me parece mais desafiadora e provocante, inclusive "fatal", pois quando associamos os elementos do filme à palavra elegia, do título original "Elegy", verificamos que o significado de fatal desliza para um outro sentido em relação à personagem feminina, já que ela descobre estar com câncer. O jogo de alternância de sentidos rompe com a cristalização do signo marcado e engessado nas práticas discursivas cotidianas. Os sentidos da palavra fatal, no filme, aparecem num jogo de luz e sombras onde o sentido erótico e de morte se alternam, tocando-se por vezes. Um evento de dor e pesar se tranforma em aprendizado, mudando as vidas das personagens, sobretudo do prof. Kapesh, que tem dificuldades para lidar com os vínculos afetivos.
Por outro lado, retomando as últimas palavras do parágrafo anterior, podemos fazer ainda uma outra leitura, ao associarmos a palavra elegia ao personagem masculino, que é o principal, pois a ação do filme se desenvolve a partir dele em diferentes núcleos: ele e a aluna-amante, ele e a amante mais velha, ele e o amigo poeta, ele e o filho e ele sozinho quando, submerso em seus pensamentos e questionamentos, nos faz conhecer, nós espectadores, a sua dificuldade em lidar com os vínculos, tanto com as amantes quanto com o filho. A fatalidade, nesse sentido, joga com sua dupla face: vida e morte.

Um comentário:

  1. Ainda não vi o filme , mas o livro é maravilhoso. há muito tempo não encontrava um livro que me fizesse reler as paginas mais de uma vez, tal a profundidade do que esta escrito. FláviaWolf.

    ResponderExcluir

A ética e o mérito nas produções acadêmicas

Em meio a tantas coisas que nos deixam tristes em nosso cotidiano, eis que nos deparamos com uma postura que muito nos faz acreditar em...