quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Camille Claudel, 1988 (França), de Bruno Nuytten


Assisti há pouco tempo o filme Camille Claudel, do cineasta francês Bruno Nuytten, e é sempre um prazer rever a história de uma mulher que viveu cada momento de sua vida de forma intensa, incompreendida, considerada pelo discurso hegemônico como inadequada, mesmo para a recém revolucionária França do século XIX. O filme biográfico trata do percurso de vida de uma jovem escultora francesa que se viu diante de suas paixões: a escultura e Rodin, com quem estudou e viveu uma paixão avassaladora. Diante da impossibilidade de viver na condição de amante, já que Rodin era casado, e de ter esperança que Rodin rompesse com a esposa, Claudel mergulha vertiginosamente sobre o seu trabalho, perseguida pelo fantasma de Rodin que passa a ser aquele que a explorou . Por conta disso, decide viver trancafiada e isolada para, em seguida, ser internada pelos familiares em um manicômio.

A escultura para Camille Claudel representava a expressão da sua existência, as suas emoções, as suas experiências amorosas talhadas com paixão, dor e morte. Nesse filme, as cenas exigem do espectador a leveza e a contemplação de quem está observando uma obra de arte. As cenas possuem passagens suaves, com poucas mudanças de ambiente, oscilando entre alguns interiores das residências, em geral de Camille, e nunca o de Rodin, poucas ruas e o atelier. Em termos de linguagem artística, o filme explora a jogo de iluminação, sonorização, além de mostrar um diálogo com outras artes como a fotografia, literatura. música e pintura. Além disso, apresenta as artes fortemente ligadas e dependentes da mídia, o jornal, de quem os artistas esperam alguma benevolência e promoção por parte da crítica.

O filme Camille Claudel é uma produção cuidadosa. Uma excelente reconstituição histórica, com cenas de expressão realista, bem ao gosto do filme francês. O filme segue a tradição da escola européia que explora bem as interpretações dos atores, com gestos e movimentos meticulosos, como se esculpidos, associando o enredo fílmico a um contexto que naquele momento refletia uma França após a revolução burguesa que dava esperanças para uns - nesse caso, os homens que mantinham relações com a burguesia - mas que era hostil às mulheres, sobretudo aquelas que não se "enquadravam" nos horizontes de expectativa da classe hegemônica. Não é à toa que no filme as mulheres são representadas ora como esposas silenciosas e assexuadas - que buscam desesperadamente afastar as amantes de seus maridos - ora como amantes, a quem os momentos de prazer são compartilhados de forma intensa, mas instáveis.
Vendo-se explorada pelo amante e empresário, Claudel acaba justificando a sua clausura, se afastando de todos. O seu medo traduz a dificuldade da mulher naquela época em exercer uma profissão, sem a intermediação de alguém que a "apresentasse", que a legitimasse. O fato de depender profisionalmente do homem - ter a sua obra assinada por Rodin - contribuiu para acentuar a dependência amorosa, numa relação de dupla subordinação psicológica.

2 comentários:

  1. Adorei o filme [ O estranho caso ]. E o que efeitos gráficos e artisticos há mão foram bem trabalhados. Perfeito ;)

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  2. Obrigada, Azânia, pelo seu comentário. Está gostando das outras matérias?

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